Não recomendado a menores de 18 anos. Vá jogar videogame, menino!
Uma vez, num episódio do seriado 30 Rock, Tracy, em busca de deixar um legado de vida, surge com a ideia de inventar um videogame que misturasse pornografia. Frank o alerta que isso seria loucura, que ninguém conseguiria isso e que seria audacioso demais. Mas Tracy usa todas suas habilidades e, enfim, termina o jogo, entregando uma cópia a Frank, que começa a jogar maravilhado. O tempo passa, e três meses depois, ele é encontrado no mesmo lugar, todo acabado, ainda jogando o game sem parar, e sem perceber quanto tempo tinha passado.
Este episódio curioso serve para ilustrar o assunto desta matéria, a relação pouco promíscua entre duas das melhores (e por que não polêmicas) formas de entretenimento do mundo: videogames e sexo (se fossem três, teria que incluir sorvete, mas não vamos complicar as coisas).
Pois é, mas sendo ambos tão divertidos, por que há uma relação tão fria e distante entre eles? Se pensarmos em outras formas de arte, não faltam exemplos de um relacionamento mais íntimo. Na literatura, a trilogia do momento é sobre… sexo (“50 Tons do C… a Quatro”). No cinema, nem se fala. Se não bastasse o apelo sexual de tudo que é filme, nem é preciso dizer a força do mercado pornográfico, ainda mais pela Internet. Mas por que com os games é tão difícil de estabelecer essa ligação?
Isso não significa que não houve tentativas. Talvez o primeiro clássico a fazer essa investida foi Leisure Suit Larry, lançado em 1987. Numa época em que, de certa forma, os videogames ainda engatinhavam, fazer uma aventura point-and-click cujo objetivo era fazer com que um baixinho, perdedor e quase careca conseguisse traçar uma mulher era, no mínimo, ousado. Não surpreende que o jogo tenha obtido grande sucesso, e a saga heroica de Larry continua viva até hoje. No entanto, deve-se ressaltar que o jogo não tinha nada de muito explícito e se apoiava muito mais no bom humor dos diálogos do que em sexo propriamente dito.
Apelando mais à pornografia, em 1992, foi lançada a versão em inglês de Cobra Mission: Panic in Cobra City, o primeiro jogo de hentai – pornografia em forma de anime, mas você já sabe o que é, seu safadenho! – a ser publicado fora do Japão. Tratava-se de mais uma aventura point-and-click, mas desta vez, em algumas cenas do jogo você tinha que realmente fazer sexo, e isso incluía escolher usar o dedo, a boca, etc, em algumas partes do corpo da mulher para tentar satisfazê-la. Se não conseguisse, ela se irritava e ia embora. Quase como a vida real. Apesar de não ser um dos melhores jogos, ele conseguiu certa popularidade e abriu espaço para que outros do tipo chegassem ao Ocidente, entre eles True Love, um dating sim pornográfico lançado inicialmente em 1995, no qual você tinha que conquistar as garotas do seu colégio para, enfim, fazer um love com elas. O game não fez tanto sucesso no Japão, só que, mais uma vez, encontrou um bom público nos EUA, desacostumado com esse tipo de coisa.
De fato, o Japão é um grande celeiro desse tipo de jogo. Desde jogos de terror, investigação a outros de dating sim, o estilo hentai é popular nos games de lá. E se não bastassem polvos usando seus tentáculos para transar com garotas em uniformes escolares, eles sempre conseguem passar dos limites. Em 2006, foi lançado RapeLay, cujo objetivo é… estuprar algumas garotas. Sim, isso mesmo, com cenas explícitas e tudo mais. Não é necessário dizer que o jogo causou bastante polêmica, sendo banido de diversos países pelo mundo. Mas essas maluquices depravadas nós podemos sempre resumir em uma palavra: Japão.
E no Ocidente? Depois de Larry, poucos jogos se aventuraram a falar de sexo e sem muito destaque. Até a insinuação de sexo era altamente incomum, principalmente fora dos PCs. Creio que a minha primeira experiência vendo um jogo insinuar que os personagens fizeram sexo foi Xenogears, lançado em 1998 para o Playstation. Numa época em que, muitas vezes, os jogos tinham que retirar referências a cigarros e bebidas alcoólicas para serem importados do Japão, sexo era um tabu maior ainda. Mas neste JRPG, um beijo, seguido da personagem feminina acordando na manhã seguinte cobrindo o corpo com o lençol, já era inovador para a época.
No novo milênio, as coisas começam a mudar, e o sexo começa a penetrar com mais vigor no mundo dos games. A série Grand Theft Auto, se já não causava bastante polêmica com sua temática violenta, também foi pioneira em tratar de temas mais “adultos” (violência também não seria? Enfim.). Em 2001, surgia Grand Theft Auto III, um dos jogos mais bem-sucedidos do PS2, no qual era possível, entre outras infrações do Código Penal, “contratar” prostitutas, levando-as com seu carro a um canto escuro para assistir-lhe balançar de um lado para o outro. Ah, e sim, você podia matar a prostituta depois e pegar o seu dinheiro de volta, mas isso é outra história. Os jogos da série continuaram a se aprofundar no tema, cada vez mais saindo do teor implícito para cenas um pouco mais explícitas, tanto na linguagem quanto no visual. Mesmo assim, ainda havia barreiras, como indica a retirada de um mini-game de sexo da versão final de Grand Theft Auto: San Andreas, o que só foi descoberto depois graças ao desbloqueio de hackers, deixando doidos de alegria o público com testosterona em alta, e doidos de raiva alguns políticos, entre eles a então senadora e atual Secretária de Estado Hillary Clinton, que pedia novas leis de controle de conteúdo dos jogos eletrônicos.
E não ficou por aí. Em 2005, God of War, também envolto em bastante controvérsia, incluiu algumas cenas de sexo no meio de toda a violência gratuita cometida pelo deus da guerra Kratos. As cenas eram poucas, com nada de muito explícito, exceto mulheres seminuas chamando o “herói” para a cama. Mas o erotismo culmina mesmo no terceiro jogo da série, no qual Kratos, ao chegar à câmara de Afrodite, a encontra fazendo um ménage à trois com mais duas mulheres, e o chama para satisfazê-la, dando início a um rápido mini-game, enquanto as outras mulheres assistem a tudo maravilhadas. A cena não é mostrada a fundo, mas o jogo não hesita em mostrar Afrodite e suas servas nuas, com belos seios de fora (e em alta definição!). É, mandou bem, Kratos! Não é todo dia que alguém traça a deusa do amor, da beleza e da sexualidade.
Mas se há um gênero no qual o sexo faz todo sentido de aparecer é o RPG. Afinal, a base desse tipo de jogo é assumir um papel e se relacionar com outros personagens, e se relacionar sem a alternativa carnal torna tudo um pouco limitado, não é? Mas alguns jogos começaram a mudar essa história. As séries Mass Effect e Dragon Age, iniciadas em 2007 e 2009, respectivamente, permitiram ao jogador, dependendo de suas escolhas, encontros sexuais com outros personagens da história, com direito a cenas bem sensuais. A grande novidade (e polêmica) ficava para a opção de se relacionar com personagens do mesmo sexo, o que deixou alguns gamers mais conservadores, sem falar nos religiosos, com os nervos à flor da pele, com pedidos de boicote às desenvolvedoras. Já The Witcher II, lançado em 2011, apostou em cenas de sexo mais quentes, dignas dos pornôs de madrugada da TV aberta.
Mas e os jogos de temática puramente sexual; ou seja, pornográfica? Isso ainda é um tabu (fora do Japão, pelo menos) e poucas desenvolvedoras se aventuram por esse caminho. Mesmo quando tentam, elas enfrentam forte resistência. A última a se arriscar foi a No Reply, com seu jogo Seduce Me. O jogo, que utiliza mini-games de cartas como mecânica para você tentar seduzir as garotas em uma mansão no Mediterrâneo, ganhou notoriedade ano passado por ter sido vetado pela Valve na Steam Greenlight (apesar do clamor popular) e foi recentemente lançado para o PC e Mac. A polêmica talvez até ajude o jogo a atingir algum grau de sucesso, mas ela simboliza a dificuldade de um jogo desse tipo chegar aos grandes canais de vendas.
Mesmo oferecendo essa retrospectiva, ainda não foi possível responder: por que é tão difícil unir sexo e games? Talvez o motivo seja porque os jogos eletrônicos ainda são vistos pelos políticos e até mesmo pelo mercado como atendendo a um público infantil. Mas esse moralismo soa hipócrita quando se leva em consideração a quantidade de jogos violentos disponíveis, dando a entender que matar alguém não é tão ruim quanto consumar o ato com a mulher amada.
Além disso, quem cresceu jogando videogames nos anos 80 e 90 não é mais criancinha, e dos que permanecem gamers convictos, pelo menos parte deles (digamos, uns 99%) certamente consome material pornográfico de algum tipo. Unir os dois de maneira competente garantiria, certamente, um bom lucro para quem se aventurasse.
Mas se deve levar em conta também outro aspecto: o mercado mundial de games é pautado pelo americano, cuja sociedade expressa ainda um forte puritanismo em matérias de sexo. E assim como o cinema demorou a aceitá-lo como parte integrante e natural, os games estão começando a atingir a puberdade e a explorar tudo o que o sexo pode oferecer. E com o avanço das tecnologias, acredite: as possibilidades são muitas.
E você, leitor, tem outro jogo que veio à sua mente que encara o assunto? Qual a sua opinião? Conte-nos! Mas nada de conto erótico, hein? Afinal, ainda somos um site de família. Ou quase. 🙂