Viagem no tempo, referências à nerds a todo momento, uma escola cheia de gente malvada que ama praticar bullying, teoria do caos… nada disso é novo na cultura pop atual, certo? Porém Life is Strange (disponível para PS3, PS4, Xbox 360, Xbox One e PC) é um jogo que traz todos esses elementos e consegue ser uma das coisas mais inovadoras que já joguei na vida. Se você não entende porque as pessoas estão enlouquecendo com esse jogo, pega sua polaroid e vem.

No game nós encarnamos Max, uma jovem estudante de fotografia que acaba de completar 18 anos. Max é uma nerd viciada em fotografia analógica, especialmente em selfies, com uma grande admiração pelo seu professor de fotografia, o famoso Mark Jefferson. É essa admiração que a mantém na Academia Blackwell, na pequena cidade de Arcadia Bay, mesmo sentindo que não se encaixa no ambiente esnobe da escola de artes dominada pela elite que comanda uma fraternidade chamada Vortex Club.

Max tem uma relação complicada com Arcadia Bay: passou sua infância na cidade mas se mudou para Seattle com 14 anos de idade, deixando para trás sua melhor amiga Chloe, que tinha acabado de perder o pai em um trágico acidente de carro. Incapaz de lidar com a morte e com o luto de Chloe, Max passa cinco anos sem entrar em contato com a BFF. Nenhuma ligação, mensagem, email, cartão postal. Pior. Amiga. Ever. Quando ela volta para Arcadia Bay e se reencontra com Chloe precisa lidar com o ressentimento (justo) da amiga que se viu abandonada em meio ao pior momento da sua vida. Para piorar, Chloe está passando por outro drama: sua atual melhor amiga Rachel Amber está desaparecida há meses, em circunstâncias suspeitas.

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E calma que vem mais novela: é em meio a esse turbilhão todo que Max descobre o poder de voltar no tempo e mudar o fluxo dos acontecimentos. E ela passa a tentar usar esse poder para ajudar os alunos de Blackwell em seus problemas diários, e se une a Chloe em sua busca por Rachel. A partir daí Max mergulha cada vez mais fundo em uma espiral de bullying, abuso de poder, drogas e aparências que enganam. Nada é o que parece em Arcadia Bay.

Um dos maiores méritos de Life is Strange é usar os clichês e referências dos gêneros suspense e ficção científica sem que a narrativa fique óbvia. As inspirações mais claras (citadas diretamente inclusive) são Twin Peaks, Efeito Borboleta e Blade Runner. O jogo consegue amarrar as citações sem que elas pareçam forçadas, encaixadas apenas pelo apelo com o público fã de cultura pop, com a trama que aborda temas atuais e relevantes como cyberbullying e violência sexual.

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A jogabilidade é simples, no estilo point and click. Tive alguns problemas jogando no PC devido a superaquecimento que depois descobri em fóruns serem comuns no jogo, e por isso acabei abandonando a versão para PC e terminando o jogo no PS4. Então fica o alerta de que a versão para computador não é lá muito bem otimizada.

Os gráficos não são impressionantes, mas a beleza plástica do jogo chama a atenção, especialmente a iluminação. Outro espetáculo a parte é a trilha sonora perfeita para a atmosfera “hipster melancólica” do jogo. Você provavelmente vai estender certas cenas para ouvir melhor.

Life is Strange também é a prova de que é possível fazer um jogo que aborde as vivências femininas com muita sensibilidade sem ficar chato ou apelar para o didatismo. Um exemplo é Max passar a ser chamada de “feminazi” na escola sem sequer militar, apenas por ajudar suas colegas. É interessante também a inserção de um personagem que demonstra interesse romântico pela protagonista, que pode ser simpático quando o player demonstra reciprocidade ou agressivo e inconveniente quando rejeitado, o que movimentou uma discussão muito produtiva sobre o conceito de friendzone nos fóruns dedicados ao jogo, assim como a evidente tensão romântica e sexual entre Max e Chloe. O jogo é bem sucedido em abordar esses temas com honestidade e naturalidade, sem oportunismo ou fetichização. Vale muito a pena.